No último dia antes do fim do mundo a
fiscalização geral de refugiados disse que cada pessoa só podia levar uma coisa
para o abrigo e que caso funcionasse essas coisas deveriam ajudar a construir o
mundo novo. O homem indeciso olhou sua casa, sentou no sofá observando tudo que
havia na sala, chorou ao ver a comida do cachorro envelhecida, olhou o retrato
da mulher que já tinha se despedido anos atrás para viver com outra pessoa em
outro local. Viu sua estante cheia de poeira e livros – estes que fizeram parte
de toda sua vida, por um instante um filme passou em sua mente e chorou. Agarrou
um livro velho e surrado e aos prantos que não pararam de cair sob seus cabelos
longos que atrapalhavam o escorregar das lágrimas. Parecia que a vida que ele
tanto amava já havia findado antes do fim do mundo. Olhava ao redor da casa
percebeu os retratos, regalos decorativos de amigos e um quadro mostrando uma
possível glória com bandeiras vermelhas e pretas erguidas. Perplexo olhou o
quadro, lembrou aquela história, sorriu sozinho diante de uma sala antiga e
prestes a deixar para trás, quebrou o vidro que separava a foto e a rasgou. Foi
à estante e pegou um livro cheio de letras douradas e com algumas orelhas
parecia que havia lido a pouco tempo. Em letras garrafais lia-se: Bíblia
sagrada Novo Testamento.
O homem
depois do choro e lamento lembrou que aquela coisa era a única que ele não
poderia deixar para trás e ajudaria a construir a vida nova aonde talvez eles fossem
se restabelecer. Abriu o livro: “Salmos
9:10 Os que conhecem o teu nome confiam em ti, pois tu, Senhor,
jamais abandonas os que te buscam.”. E uma paixão cheia de confiança o tomou,
aquele salmo só poderia ser uma mensagem do todo poderoso ao homem. Tudo aquilo
passou a fazer mais sentido a ele, tudo seria uma aprovação que tinha que
passar, todos os cultos, todas as dores, todas as dificuldades tudo não passou
de um plano do senhor. Separou o livro e o colocou na bolsa, beijou a foto de
sua ex mulher e ainda antes de sair foi
a cozinha admirou aquela comunhão que estava retratada no quadro da santa ceia, fez o sinal da cruz e
saiu.
Na porta do abrigo os fiscais
verificavam o que as pessoas haviam trazido de coisas para levar e ajudar a
construir o novo. O que os fiscais entendiam que não ajudaria era descartado e a pessoa era
obrigada a voltar e esperar a nova fiscalização, perigando não conseguir sair
antes do fim do mundo. Só se ouvia os lamentos e tiros disparados para o alto
devido as pessoas querendo invadir o local. Quando chegou a sua vez o homem
olhou diretamente nos olhos do fiscal e tirou na bolsa aquilo que trouxe, sem
pestanejar o fiscal o deixou passar.
Chegando sentiu o novo, o cheiro das
flores inundava o ar,viu as pessoas felizes por estarem vivas e se reconhecerem
como uma parte da outra e necessária para a nova empreitada. Enfim o mundo novo
seria reconstruído, não era de fato o fim, mas o começo de outro ciclo. Não
havia melindres entre as pessoas. O homem sem esquecer o que havia trazido para
a construção do novo mundo o tirou da bolsa, olhou para baixo onde havia uma
cova rasa de uma pessoa que não agüentou a viagem, olhou para pessoa, viu nos
seus olhos abertos um caminho que teria que trilhar, se abaixou e colocou o
livro dentro do bolso interno no defunto, tirando uma folha rascada de dentro. Pediu
ao fiscal para tapar o buraco. E voltou admirar o mundo novo que esperará,
olhando a foto da glória com bandeiras vermelhas e pretas erguidas.
A conspiração – 19/12/16.
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